quarta-feira, 28 de setembro de 2005

Camp Pêche

Tenho vontade é de descrever a vista da janela da sala de minha casa. Todos os dias eu tento, sem sucesso, ligar o computador. A tela está queimada.

Escrevo aqui na casa de terceiros. Não é inspirador.

Não me falta, na realidade, tempo de sentar e escrever. Isto eu tenho de sobra, e mais do que tempo eu tenho, é verdade, vontade. Tenho muita vontade de me sentar e, dia sim, dia não, ou hora sim, hora não, escrever para as poucas pessoas que me lêem. Escrevo, disse e digo novamente, para mim mesmo. O meu journal está jogado a um canto; creio que a vaidade fala um pouco aqui, na minha vontade de devassar um tanto da minha vida. Devassar somente aquela parte que eu quero que vejam, obviamente. Há um tanto muito que passa batido, praqueles que passam por mim na rua; os poucos que me vêem, e eu sei quando me vêem ou não, amo e odeio. Sentimento além deste: admiro-me com o meu olhar de cachorro sem dono.

Escrever, escrever...

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Sonhei esta noite passada coisas interessantes. O único fragmento que consigo me lembrar, 13 horas depois, é que sonhei com um lugar qualquer, onde moravam pessoas humanas, e que tinham o costume de, quando duas ou mais pessoas se uniam em uma união enigmática, mítica, a mãe de um deles era carregada pelo "portão das senhoras", largada suavemente em um descampado obscuro, e acariciada quase devotamente pela meia dúzia mais próxima, talvez como uma divindade telúrica. O nome de uma delas era Clemenzil, o que me parece o nome comercial de uma pomada para acnes.

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Os pescadores estão desistindo de ser pescadores. Artigo lido recentemente no nosso jornal local. Não me surpreende em nada, isto: quem quer ganhar o seu pão na profissão menos reconhecida?

Fico triste, porém. Tinha um projeto de me meter a conversar mais com os pescadores, e escrever sobre eles. Todos eles: os que pegam camarão na água calma da Lagoa. Os que metem o pé no lodo das previsíveis baías internas, e aqueles que pegam "siria" com ova no mesmo lodo dos mangues. E, principalmente, aqueles que se metem nas pequenas bateiras, ou nos barcos fortes betumados, e se lançam às aguas mais geladas, revoltas e azuis do lado atlântico.

Ainda há tempo, tempo de suave melancolia.

domingo, 25 de setembro de 2005

Devassa ontem. Edição mais chiquê, com Zuleika e os convidados e Cansei de ser sexy. Mais uma edição do torneio de desmoralidade, de ampla base epistemológica. Circulação infinda de figuras-pessoas repetidas em corredores caseiros e boiteros, com amplas declarações de amor sempiterno, ad nunc.

Odeio pessoas desmemoriadas. Odeio o que o álcool faz com muita gente. Gosto de sexo no meio do dia, com os pulmões cheios de ar fresco e o corpo bem, e minha cabeça livre.

Comecei a frequentar uma aula de ashtanga, acho que se escreve assim, né não? Para complementar e ampliar a minha prática caseira. Professor substituto tudo de bom, sentidos mil; ótimas razões para dedicar meu horário de almoço contraindo o períneo e respirando como um aspirador de pó.

Muita psicanálise e gestalt, e o resto é silêncio, pois não me sobra tempo para sentar e escrever. Ponto.

sábado, 17 de setembro de 2005

Inefável

http://www.geocities.com/orchatasecunda/textos/inefavel.html

Aquele, aquele que eu tinha escrito. Lindo de paixão.

O blog da querida Liz, novidade até para mim, está ali do lado: La farfalla.

E a chuva continua. Estou ensopado até os miolos.

sexta-feira, 16 de setembro de 2005

Eu tenho de vir em casa de amigos para escrever estas coisas aqui; não tenho muita vontade de prolongar as minhas impressões neste ambiente.

Escutando Miss Kitten, though.

Willuzitos, Iso, Bruno e eu estamos pensando em promover uma puta festa para o dia de finados, ou qualquer coisa assim. Will e Isa vão pros EUA no final do ano; a proposta é esta, festar sem ganhar nada.

Estou lendo muito Dogen ultimamente. A lógica da filosofia zen (que precisa de uma lógica, claro) é um tanto alternativa, e excitante. É sobre isto que eu queria escrever um pouco mais, se estivesse à vontade.

O tempo em Floripa está melequento, de tão contínua chuva que cai. Tenho feito a saudação ao sol todos os dias, várias vezes, e o meu banquinho de meditação nunca foi tão usado em sua curta vida. Em compensação, tenho exagerado na bebida, bastante para ser mais exato, e a palavra heavy boozer fica pipocando de hora em hora. Eis o superego.

Meu pai passeia em Cachoeiro, provavelmente procurando a mão na cabeça que ele não encontra mais entre nós aqui. É um cara muito sacana, este seu Luiz.

Mari e suas idas e voltas emocionais, e mamãe finalmente está mais calma em quase tudo.

O gato continua se lambendo, e me vence fácil fácil na flexibilidade. Quando eu tinha quinze anos eu me gabava de ser flexível "como um gato", mas vejo que não era bem assim.

Estes são os tempos de greve na Federal; três paixões por semana, todos belíssimos, por sinal, e niente de alguma coisa mais. Vacas magras ou gordas? Vacas, se as forem de verdade, o que já dá prum cottage.

Marisinha, agora, Pale Blue Eyes. Lindona; lembra os meus tempos de musicagem total com a Madame Liz.

quinta-feira, 8 de setembro de 2005

Independência?

Duas novas poesias na madrugada pós-independência!

Na verdade, quatro, com direito a revisão de outra, o que conta cinco; uma delas, porém, quedou-se incompleta, e a outra, de título "Inefável", ficou por cima da minha cama, no prédio ao lado. Paciência. É uma bela poesia, devo confessar, e quase que posso transcrevê-la de cabeça, por ter não mais que umas duas dúzias de palavras. Estou em dúvida quanto a uma vírgula, porém.

É só sentar que as coisas saem.

Quanto à situação sócio-político-econômica, bem, não me lixo mais com ela. Ora pois. Confesso que me vi rimando, no ônibus, uma musiquinha que era mais ou menos assim:

Jean Charles, desce da cruz!
Nova Orleans virou cuscuz.
Quem levar "seo" Bush de joelhos,
mordendo o travesseiro,
ganha de brinde um bombardeiro.

Lindo, né?

Lá vão as duas, então: http://www.geocities.com/orchatasecunda/textos/muquiranas.html e http://www.geocities.com/orchatasecunda/textos/satie.html.

Bom apetite.

domingo, 4 de setembro de 2005

Dias muitos interessantes, estes últimos. Por onde começar.

Na sexta-feira, o dia inteiro dentro do meu quarto, pausa para uma caminhada no sol da tarde. Arrumando. tirando do armário aqueles quilos e quilos de papel (perto de quarenta, no total) que compunham textos e textos da facul, as milhares de outras coisas e, principalmente, as minhas cartas.

Lá pelos idos de 98-00 eu costumei trocar muitas cartas com muita gente. Maioria delas naquele negócio de excers e trekkers, que naquela época eu gostava bastante de X-files e Star Trek, mas isto é assunto pra outro dia. Eu já fui um pouco nerd, vocês precisam saber.

Havia também umas dezenas de cartas de amores, estas coisas. Muitas eu não cheguei a abrir, mas não consegui resistir a abrir algumas delas. E uma delas eu não resisti à idéia de guardá-la, novamente.

Só guardei, também, aquelas das duas pessoas com quem eu ainda me comunico. Adeus, Fernanda, Marjorie, Márcio, Roberta, Mari Sakaki, Dani Kumada, Valmir, Leonardo, ....

Maior surpresa foi redescobrir os apelidos carinhosos trocados. Pinguinzão foi o mais surpreendente deles, pois eu realmente não me lembrava. O resto é silêncio.

E alguns escritos, poemas, poemetos e pequenos textos dos meus 15, 16, 17 anos! Muitos, isso eu encho a boca para falar, me encheram de orgulho. São bons. Pra idade, são bons. E não estão na minha "gênese": são inéditos.

Impressão de uma viagem a Ouro Preto, nos meus 17:

Esta cidade é uma delícia para descer de bicicleta.
Descer somente.

Autocomentário:

"Olhe só" disse lucas [sic] ao se secar e botar a roupa ainda dentro do banheiro "a gente muda". Mais tarde, ao pendurar a camiseta azul no espelho, de modo que não amassasse para o dia seguinte, ele se perguntou se este ato não teria nada de simbólico a contribuir para a sua mitologia. Tenho pena deste meu rapaz.

Pequena poesia; a letra indica os 15-16 anos:

O que é tão assustador
e atraente agora
é que você vai acordar
sozinho

Um dos meus
melhores defeitos
é não enxergar
poesia
na poesia

Você pode?
Me diga
as suas dores não serão mais minhas

Você me escreve, me enrola,
me dá um tapa, ou um fora
mas eu gosto
seu realce traçado no rosto
e assim eu esqueço todo o resto

Que nome dar? "Masoquista"?

Eram nove horas da noite, indo pras dez, e eu ainda de vassoura em punho, arrancando as pobres aranhas dos cantos mofados da parede do leste, quando me ligam e pedem a minha presença. Eu vou, tomo uísques aqui e ali, com adições indianas, e tenho uma boa noite.

Algumas ressecas minhas me deixam com uma paz de espírito deliciosa. Nesta, eu não sabia que Mariana tinha acabado de descer do avião logo que eu acordei. Vinda da Bósnia e Croácia depois de três meses, Mari me presenteou com uma barra de Milka dos Balcãs, na tarde noite e madrugada que eu, Liz, Kati e ela ficamos conversando longamente, muito de sexo tantra e estas coisas, tomando suco de vinho.

Falta aqui, porém, os dois arremates: um pertence ao futuro, o qual não ouso tocar, e o outro foi uma chuvosa e bela tarde de quinta-feira.

Tenho esta vontade de deixar as palavras correrem soltas, a encontrar quem ou o quê que lhes creia, sinta ou afague. Dá alguns problemas, mas vale a pena, no final das contas. Pois no final das contas há um fecho, para não deixar as pérolas caírem no chão, e no final das contas que palavra há de bastar?

Quinta-feira, depois do café, senti vontade de ler um trecho do "Memórias de Adriano", da Yourcenar. Aquele que fala da "nuvem vermelha de que a alma é o relâmpago".

Não conheço, fora do amor, outra situação em que o homem deva decidir-se por motivos mais simples e mais inelutáveis. No amor, o objeto escolhido deve valer exatamente seu peso bruto em prazer, e é ainda no amor que o amante da verdade tem maiores probabilidades de julgar a nudez da criatura. A partir do desnudamento total, comparável ao da morte, de uma humildade que ultrapassa a da derrota e a da prece, maravilhamo-nos ao ver renovar-se, cada vez, a complexidade das recusas, das responsabilidades, das promessas, das pobres confissões, das frágeis mentiras, dos compromissos apaixonados entre nosso prazer e o prazer do outro, tantos laços impossíveis de romper e tão depressa rompidos! esse jogo cheio de mistérios, que vai do amor de um corpo ao amor de uma pessoa, pareceu-me belo o bastante para consagrar-lhe uma parte de minha vida. Aspalavras enganam, especialmente as do prazer, que comportam as mais contraditórias realidades, desde as noções de aconchego, doçura e intimidade dos corpos, até as da violência, da agonia e do grito. A pequena frase obscena de Posidônio sobre o atrito de duas parcelas de carne, que te vi copiar nos teus cadernos escolares com aplicação de menino ajuizado, é incapaz de definir o fenômeno do amor, assim como a corda que o dedo faz vibrar não pode explicar o milagre dos sons. Essa frase insulta menos a volúpia do que à própria carne, esse instrumento de músculos, sangue e epiderme, essa nuvem vermelha de que a alma é o relâmpago.
Confesso que a razão permanece confusa em presença do prodígio do amor, da estranha obsessão que faz com que essa mesma carne, que tão pouco nos preocupa quando compõe nosso corpo, limitando-nos somente a lavá-la, nutri-la e, se possível, impedí-la de sofrer, possa inspirar-nos uma tal paixão de carícias simplesmente porque é animada por uma personalidade diferente da nossa e porque representa certos traços de beleza sobre os quais, aliás, os melhores juízes não estariam de acordo. Aqui, como nas revelações dos Mistérios, tudo se passa além do alcance da lógica humana.