terça-feira, 1 de setembro de 2009

Redução redux

Ultimamente eu quis tentar reduzir - como se reduz o vinho (branco) antes de colocar nos champinhões frescos em tiras, que a essas alturas devem estar chiando na manteiga fresca e uma leve esfumaçada de pimenta-do-reino preta - os meus interesses e pensamentos e desejos, para daí extrair uma espécie de caldo base ou quintessência dos mesmos.

O sucesso de tal empreitada muitas vezes se reduz ao mínimo, pois é difícil encontrar este carnegão, talvez pelo simples fato de que ele possa não existir. A tentativa, porém, é de valia. Afinal, como é dito, our life time here's so short [and] a new one can't be bought.

A rotina, o mesmo, a repetição, enfim, é o que pode nos ajudar, ao contrário do que pensamos, tantas vezes. A capacidade de "não mudar" - a torto e a direito - é o que nos aponta. Do que estamos sempre falando, a que (ou quem) sempre nos referimos, com o que sempre sonhamos... "sempre", aqui, aponta para tudo aquilo que aparece mais do que "deveria", e que nos estranha um pouco por isto.

E então, a partir do momento em que temos um pouco de conhecimento de causa disto, podemos tomar umas tantas rédeas e fazer diferente, fazer diferente com o mesmo. Isto não é interessante?

Já nas primeiras fases do meu curso de psicologia, recém-completo amém, eu sabia que "não era bem aquilo". Na quarta fase cogitei mudar de curso - a balança caía para um curso de letras, mas só de pensar que eu ia estudar mais 4 anos para ser professor* eu me desesperava intimamente. Então estudei mais 6 anos e meio... para quê? Para ser psiterapeuta. Única e exclusivamente. Claro como água desde o início. Nada mais ou menos do que isto. Qualquer outra coisa é muleta.

Foi uma escolha chata, que fiz sem pestanejar, com umas consequências aporrinhantes, enfim.

Sempre foi um tanto claro, então, qual o meu interesse intelectual. Não é difícil saber: basta fazer um parsing dos meus escritos, da minha fala, das minhas leituras.
Fala, linguagem, palavras. Como a linguagem não dá conta do mundo, como não existe fala plena, como sempre sobra algo. As armadilhas da linguagem, o jogo de palavras. O sujeito na linguagem, o sujeito da linguagem. Filosofia da linguagem. Consciência. Os enganos da consciência. Conhecimento, auto-conhecimento e suas ilusões. Ilusões e enganos em geral. Charlatões, pseudociência, e o porquê de nos enganarmos tanto com o que é quase evidentemente falso ("auto-engano"). Vícios.

Retórica, poesia, figuras de linguagem, música, ritmo, sons. Cantar e cantar; harmonia, ressonância. Como falar, como falar bem, como cantar. Persuasão, sedução, sugestão, hipnose - psicanálise. Fala como história; história; história da fala. Etimologias, raízes de palavras. Línguas, aprender línguas.

Saber e sabor; aromas, cheiros, sabores, e o que sabe a quê.

Comer e beber; comer e beber como necessários, comer e beber como prazeirosos, comer e beber como excessos. Saúde através do comer. Vícios. Relação "mente" e "corpo". Comida como remédio, cosmético, e vice-versa. A difícil linha entre "droga" e "droga". A difícil relação homem-substância. Excessos. Deficiências.
E o acima, obviamente, não esgota o assunto. É o que vem à cabeça mais facilmente. Há outras coisas que sei mas não consigo falar.

Vamos a um pouco de einfall amador? "Vamos", exclamam os leitores ávidos de sangue psíquico.

Parece que as coisas se concentram na boca, na língua, no nariz. Falar, provar, cheirar. Ranjo os dentes de noite; tenho bruxismo. Até hoje respiro pela boca, sem o querer; tenho de prestar atenção para respirar pelo nariz, e durante o zazen, com o rosto relaxado, os lábios ficam entreabertos e pareço a Mônica. Usei aparelhos durante um tempo, quando criança. Meu maior problema, atualmente - soa tolo, eu sei - é o siso esquerdo que parece colado com força gravitacional forte na gengiva, e que me custará 800 reais para tirar. Os outros dois sisos custaram 400 e estavam apenas com as raízes abertas (duas horas e meia para tirar). O nariz é grande mas não serve para muita coisa; cheira um pouco bem, mas como entrada de ar é uma negação, mesmo depois de uma cirurgia de septo. Felizmente contradigo, porém, a tese fliessiana de uma associação intrínseca entre o nariz e os órgãos sexuais - ou será que quero me circuncidar ou me castrar? Quando criança tinha bronquite e rinite, e atualmente estou tendo problemas com o meu sensível nariz - tive de voltar a ter uma cartelinha de loratadina na mochila. Ah, a mochila foi roubada estes dias. Quando criança estava "patinando" em uma sala do colégio quando um "coleguinha" botou a perna na minha frente, caí de cara no chão, sem me proteger, e quebrei os dois dentes da frente. Uma Mônica de dentes quebrados. Será que estou na fase oral? Chupei muita chupeta? Diz mãe que não, embora eu tenho fotos que comprovem o contrário. Em uma delas, um bebê louro no colo do pai frente às cataratas do Iguaçu. Pelo menos isso significa que fui além da fase anal. Êêêê. Sou mais desenvolvido. Quero o meu certificado de fase oral, por favor. Mas, e não sou um "invertido"? Hum, vai ver que estou atrás da chupeta primordial.
*Quanto a ser professor, nada contra, mas nada a favor. Embora pareça ser um intelectualzinho, tenho a confiança íntima de que dedicar-se somente a pensar, sem colocar nos atos (e não falo "em atos", pois a maioria das pessoas pensará que é colocar idéias em atos, e não é, é colocar você mesmo e a sua vida nos seus atos) é um porre. Nada me dá mais ojeriza do que gente que só sabe "pensar". Além dos bien-pensants, claro.
Tenho a leve impressão que vou acabar como Wittgenstein ou Hesse: calado, cuidando de um jardim.

0 comentários: