quinta-feira, 16 de março de 2006

Qual o gosto de uma taça de cicuta?

"Sócrates pura e simplesmente queria morrer."

Uma das frases deliciosas do livro que estou relendo, aos pouquinhos e com bocadinhos de obras afins e alheias: "O julgamento de Sócrates", do jornalista americano que, mal conheci, sempre amei, I. F. Stone (as iniciais são de nomes tão horrendos que, dizem, quem os escutar terá dispepsia, sudorese noturna e dissociações esquizóides).

Neste livro Stone analisa, com detalhes e a finesse de um bom esquerdista defensor da liberdade de expressão individual, o mais famoso (e funesto) acontecimento da tão democrática Atenas. Não sei se falei deste livro antes: temo que me repita demasiado. Foda-se. O que Stone faz ver é que não, Atenas não está desculpada de ter assassinado um dos maiores usuários da parrhesia, da liberdade de expressão ateniense; o que ele deseja é dirimir um pouco a mácula e, principalmente, dirimir um pouco a aura heróica, quase santa, que cerca a morte do famoso filósofo.

Das idéias anti-democráticas de Sócrates todos os estudiosos já as sabiam, e não é preciso muito esforço para, lendo o que Platão e Xenofonte nos escrevem dele, chegar a uma percepção disto. Sócrates era alvo da gozação de várias comédias contemporâneas suas, o que era normal na Atenas daquela época, a comédia servir como meio de crítica e apontar incongruências dos figurões e detentores de cargos públicos. O homem que ficava o dia todo à palaestra, onde os jovens se exercitavam, e na agora, convocando as pessoas que achavam que eram sábias a se verem ignorantes (ou menos sábias que ele, dado que ele ao menos sabe que nada sabe), adorava fazer o mesmo com os cidadãos de mais influência, mostrando que a democracia era, enfim, uma merda, pois nenhum de seus governantes (o povo quase como um todo, no final do intrincado e até belo sistema democrático ateniense) tinha qualquer conhecimento de como governar, pois não conseguiam sequer definir o que é a virtude, o seu infatigável questionamento sobre a virtude...

... e se orgulhava de não cobrar nada por seus ensinamentos à juventude que o segue e passa a adotar o mesmo método para ridicularizar os poderosos, passando-os por néscios.

Até aí, tudo bem, adoramos fazer isto até hoje. É bem legal.

Acontece que as tendências...

(Você, leitor, quer conhecer o final desta fascinante história? Mande a sua opinião, ou até mesmo sugestões de o que poderia ter acontecido ao querido e feio Sócrates!! Continuamos no próximo poste.)

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